quarta-feira, junho 27, 2007

Anjo

Deparo-me com uma paixão eterna pela vida, por mais barreiras que encontre tapando o sol que, todos os dias, me envia um sorriso maroto, num "flirt" constante.
Não há nuvem obesa que o impeça.
As persianas do optimismo não se fecham nunca por completo.
Um raio de esperança permanece, ousado e teimoso, me aquecendo o coração.
Um fio de brisa fresca trespassa o escuro.
Não há tempestade que me derrube definitivamente. Atrás de uma lágrima vem um sorriso inevitável.
Quem sabe nao terei também um "anjo-da-guarda" bem perto de mim, oculto, mas sempre presente e atento (?).
Ouso afirmar que a sua existência é quase perceptível, independentemente do nível de credibilidade que esta afirmação possa suscitar.
Para quem não viu, fica a sugestão, já clássica, do filme: "The city of Angels" com Nicolas Cage. Marca qualquer pessoa com o mínimo de sensibilidade. Confesso que me fez chorar, sorrir, reflectir, meditar, questionar, duvidar e acreditar. Na altura, aconchegou-me a esperança de continuar mimada e apaixonada pela vida. Toda essa emoção positiva tão completa, inesperadamente despertada, ainda hoje me embala nas noites que prometem ser mal dormidas e me acorda docemente, todos os dias.

segunda-feira, junho 18, 2007

Carlota


Esta é a minha menina. Nasceu em Outubro, segundo as previsões médicas. Era uma cadelinha abandonada. Quando a fui buscar era pequenina e estava muito doente. Os outros animais, na sua jaula de precárias condições, foram-me sugeridos como objectos. Olhei para a Carlota. Lembrava-me um pouco a Janette, mas outros cães que lá insistiam em chamar-me, enchendo o ar de latidos quase desesperados, eram muito mais parecidos com a minha doce Janette. Olhei para a Carlota e solicitei que abrissem a sua jaula. O nome que lhe tinha sido atribuído era deveras estranho. Nem vale a pena referi-lo. Dá vontade de rir. Sei que Carlota também suscita um sorrisinho, por ser nome de pessoa. Na minha opinião, qualquer animal merece um nome digno. Um nome de pessoa.


Quando a vi, estava junto da sua mãe e irmã que tinha o pêlo completamente pretinho. A mãe, adoentada, com pneumonia (conforme me informaram posteriormente) e a caminho da esgana, como é usual nestes sítios, onde os surtos se espalham num piscar de olhos, exibia a mistura das cores do pêlo das filhotas. Quando peguei na Carlota, estava emocionada. Não consegui controlar-me e chorei. As saudades da Janette eram tantas e cada vez são mais. Aquela lacuna ficou para sempre. Na altura, tinham passado duas semanas após o sucedido com a minha menina. E eu, nessa altura, tinha jurado não me afeiçoar mais a nenhum animal de estimação. Impõe muita dedicação, responsabilidade, tratamentos e cuidados e, na sua eventual perda, o mundo desaba. Sofremos muito. Esse tipo de dor não se perde nunca.


Naquele momento, quando olhei para a Carlota, encantei-me de imediato pela cadelinha frágil e pequenina que se aconchegava nos meus mimos e me lambia a cara toda, de forma descontrolada. O seu pêlo era macio e lindo. Mesmo trémula, assustada, não parava de me lamber a cara.


Sentia o pulsar do seu coração pequenino nas minhas mãos. Era tão pequenina que podia segurá-la apenas numa mão. Espirrava frequentemente, aparentando estar doente, por isso insisti na consulta médica imediata, o que não ocorreu. Carlota foi assim colocada nos meus braços: doente e debilitada. Não consegui separar-me dela. Carlota escolhera-me a mim, nitidamente. Um dia a mais naquele lugar e a pequenina estaria provavelmente condenada a um destino muito doloroso. Seguiram-se internamentos, tratamentos, ansiedade e muitas lágrimas, na eminente perda de mais uma cadelinha, após uma semana de adopção, ao serem escutadas as palavras inseguras de alguns médicos que não poderiam ter a certeza se ela progrediria para a "esgana" ou não. O seu estado de saúde era incerto e, progressivamente, cada vez mais debilitado. Lutei por ela. Lutei, procurando os melhores veterinários e internamentos, tentando dar-lhe tudo o que pudesse salvá-la e essencialmente, acarinhando-a, adormecendo-a nos meus braços e cobrindo-a de mimos.
Num dos últimos internamentos, quando a fui buscar, o Dr. colocou-a nos meus braços e ela, diante de alguns familiares que me acompanharam e de algumas pessoas que estavam ali com os seus animais, ao reconhecer-me, lambeu-me de novo a cara toda, com a cauda numa agitação veloz e descontrolada, visivelmente feliz em ver-me. No espaço em que estava, toda a gente parou, inclusivé o veterinário da Carlota, surpreendido pela alegria da pequenina em rever-me, mesmo estando comigo há tão pouco tempo. Lembro-me que um dos rapazes que lá estava disse-me a sorrir, ao ver a minha atrapalhação: "Certamente, nunca levou tantos beijos assim". Eram "lambidelas", sublinhe-se. Deu-me imensa vontade de rir. A minha alegria era tamanha e a chuva de beijos da Carlota no meu rosto prolongava-se e intensificava-se, ignorando tudo e todos.


Já tem 8 meses, a minha bébé... Os dentinhos de leite que caiam da forma mais inesperada, foram quase todos substituídos pela dentição definitiva e está ficando forte, crescendo. Tantas vezes, nas suas correrias disparatadas, embatia numa cadeira e lá ficava remexendo a língua de forma estranha. Aproximava-me e tirava-lhe da boca um dente de leite, antes que se engasgasse. Frequentemente, os animais engolem os dentes de leite ou deixam-nos caídos pelo chão. Mas nesta maluquice das suas brincadeiras constantes, entende-me e mima-me de forma única. Delicia-se com os brinquedos e peluches que lhe compro e arrasta-os pelo chão como um troféu. Quando a máquina de lavar decide engoli-los por umas horas, parece que lhe arrancaram um tesouro e, sem nenhuma timidez, dá o seu escândalo canino no pequeno quintal onde brinca.
Hoje foi dia de banho, pelo que se sente o cheiro a colónia de bébé já à distância. Está linda, cheirosa, com o pêlo macio e brilhante. Carlota sabe-o e hoje está mais vaidosa do que nunca. Está se restabelecendo e, a cada recaída, luto para que seja uma cadelinha saudável, sem mais problemas e complicações. Já sofreu muito, tendo apenas 8 meses de existência.


Falo com ela como falaria com uma pessoa, explicando-lhe certas situações, ensinando-a, repetindo palavras e dando-lhe beijos a toda a hora, pelo que, muito provavelmente, os vizinhos devem julgar que sou maluca.

domingo, junho 17, 2007

Sentimentos

Não sei bem o motivo que muitas vezes leva o meu pensamento ao papel... Talvez seja todo este encadeamento de "porquês" que sublinham o meu coração; alguns arrependimentos que lutam, numa briga acesa, com as compensações recebidas. O papel serve de juíz, testemunha e cúmplice. A dicotomia do meu ser persiste. Olho em volta e constato que todos somos iguais, sobretudo os que não conseguem admiti-lo. Os sentimentos são como o sangue que nos percorre as veias e enchem de vida o coração, deixando-o bater ao compasso de um fôlego. São a nossa sobrevivência. Sem eles estaríamos definitivamente vazios, embalsamados no tempo. A transparência não é uma exigência vital. A nossa existência como pessoas, sôfregas de emoções, sim, sem dúvida que o é. Isso não se vê ao espelho. Pelo contrário, sente-se.

sábado, junho 16, 2007

Juste un petit problème...


Após esta foto de um grupo

de"chouchous",

faltam apenas 130

reclamações dos meus

restantes fofinhos não mencionados.

Está aberto o livro.

E já que vem aí uma "chuva de textos"... Podem escrevê-los em Francês.

Et vous avez juste une minute pour les écrire:

59...58...57...40...39...25...zéro...

Bah...Je vous adore pour la vie.

Ops!


Ninguém ficou esquecido no meu coração.
Estas são algumas das protagonistas mencionadas no texto "Mais um passo".
Não sei bem como essa foto da direita surgiu na minha máquina. Pestinhas. Agora reclamem...
No grupo em pose, a Tatiana é a primeira da direita para a esquerda, seguida da Susaninha, Luisinha, Petra (ou Ana Filipa? - são gémeas, por isso a distinção é tão -tão- fácil) e a Helena, atrás, tentando aparecer na foto. Quem esqueceria estes sorrisos? Sentem-se à distância. Fica o carinho para a minha querida Tatiana, para a minha querida Vanda (na foto à esquerda: a primeira niña da esquerda para a direita), e para todos os meus chouchous que, tal como elas, não mencionei no Post anterior. Todos eles ficaram no meu coração.
Ser professor também tem destas coisas:"On met les pieds dans les plats".
É o fruto natural da idade.Não se esqueçam que avancei mais um ano no tempo.


E vamos lá "fazer a ONDA"!
(...)
As "coisas" que eles me ensinam...e eu aprendo.

sexta-feira, junho 08, 2007

Mais um passo.

Hoje cheguei mais cedo que o normal. Usualmente, sou das primeiras a lá chegar, mas hoje, por ser um dia especial, cheguei ainda mais cedo. A Joaninha fazia anos e preparei-lhe algumas surpresas. A cumplicidade dos seus colegas e amigos de turma era imensurável. Às escondidas levei uma torta recheada com creme de morangos e coberta de chantilly. Passados alguns segundos após a minha entrada "clandestina", ouvi passos apressados no corredor e sussurros. Eram algumas amigas da Joaninha que vinham correndo, escondendo-se dos funcionários, fugindo às normas. A ansiedade delas era tamanha. Confesso que a minha também. O coração parecia saltar-me do peito. Entraram na sala e logo foram chegando outros, sussurrando, correndo para a sala e escondendo-se, deixando-me numa situação confituosa. Uma parte de mim sorria abertamente, enquanto que a outra, estava deveras aflita, desesperada, perante a quebra das regras estabelecidas. Susaninha olhou para mim e disse: "Parabéns, professora." Seguiu-se um daqueles abraços que mima a alma por uma eternidade. Olhei para os meus alunos e o pensamento escapou-se na mais pura honestidade das palavras: "Não me lembrava..." Realmente, naquele preciso momento ao vê-los, só pensava na chegada da Joaninha e na surpresa preparada. Não me lembrava que também eu fazia anos. Ontem, andei horas e horas procurando e pensando no que haveria de oferecer à Joaninha. Comprei-lhe um livro do Nicholas Sparks e um kit do Boticário. Queria ter oferecido prendas a todos. Os miúdos valem tudo. São como filhos. Crescem rápido. Aos meus olhos serão sempre bébés. O irmão da Joaninha também apareceu e ofereceu-se para me ajudar. Chama-se Cristiano e tem um coração do tamanho do Universo. Não ficou connosco na aula da irmã, pois frequenta outro ano.
Durante os 90 minutos de aula que se seguiram, houve lágrimas. Vi a Joaninha, uma bonequinha de sentimentos gigantes, chorar e querer escapar-se, esquivar-se, quando lhe cantámos os parabéns. Timidamente soprou as velas... O livro que lhe ofereci tinha como título: "Um momento inesquecível". E era precisamente isso que eu queria: que ela fizesse deste seu aniversário "um momento inesquecível". Joaninha chorava de emoção, visivelmente feliz.
Também eu não consegui me conter diante do que me ofereceram: as palavras mais lindas que uma professora pode receber. Pouco a pouco, surgiram postais e eu, já de coração trémulo, ao lê-los, fui deixando escapar a emoção. Li as palavras da Carolina, da Susaninha, da Marisa e da Luisinha que, no silêncio do seu lugar na sala, me observava como pessoa, desde o início do ano. As palavras da pequenina que me encantou desde sempre com o seu sorriso, foram a gota de água final. Lágrimas garantidas diante destas meninas que transbordam ternura. E o Leo que, ao entrar na sala, me entregou um pequeno saco com a sua prenda. Julguei que estava brincando comigo. Afinal, tinha mesmo escolhido algo para me oferecer neste dia. Era um porta-chaves com o meu nome. Tem sempre a capacidade incrível de me surpreender. A Micas, sempre alegre e incapaz de passar um dia sem me dar um abraço, dizia : "Professora, quer chorar? Chore. Não tem mal algum". Limitei-me a limpar as lágrimas, saltando linhas e linhas dos postais que, lidos na íntegra, traziam à flor da pele uma emoção incontrolável. Chorei, embora sorrindo... De nada servia tapar o rosto com os envelopes dos postais. Não consegui esconder os meus sentimentos, nem faria sentido algum. No final da aula, o Cristiano, também ele em vias de comemorar o seu aniversário, abordou-me de novo. Trazia um papel dobrado nas mãos e disse-me: "Isto é para si." Seguiram-se abraços e mais beijos e abraços e fotos... Uma aluna de nível mais avançado esperava por mim na porta, pois pretendia fazer teste de recuperação. Despedi-me dos meus meninos e levei-a para um local isolado onde ela poderia fazer o teste tranquilamente. Olhei para o papelinho dobrado que o Cristiano deixara nas minhas mãos e onde se lia claramente: "PARABÉNS, PROFESSORA!" Abri-o. Era um poema. Era um poema lindo, desejando-me um dia feliz e falando de mim e das minhas aulas. Carina estava concentrada, fazendo o teste. As lágrimas pediam-me licença para cair, mas o coração sorria bem mais alto. Segui o deambular da caneta da Carina e constatei que deveria ter um "Satisfaz Plenamente". Pensei no Cristiano, no Leo, na Susaninha, na Luisinha, Marisa, Ana Filipa, Micas, Petra, Vitor, Joaninha, Diogo, Marquinho, Rúben, todos, todos eles, sem excepção, (e cujos nomes não me ocorrem todos agora) e no Djinis que hoje me ensinou a dizer algumas palavras em russo.
Os sentimentos não têm nacionalidade. O calor destes alunos ficou. A ternura deles e a sua cumplicidade são memoráveis.
Não preciso celebrar um dia de aniversário, tendo tanta alegria e mimo recebidos ao longo de tantos meses e até anos. Essa é a autenticidade de uma vivência quotidiana e não de um dia apenas.
Neste ano profissional tenho vivido muitas compensações pessoais. Muitos outros anos escolares também deixaram marcas eternas. Seriam mil e uma histórias, passando por emoções e reacções diversas. Contudo, pela primeira vez, com alunos já crescidos, este ano, passei pelo inesperado. Alguns alunos, ao se despedirem de mim, choraram. Sei que, quando os vir de novo, alguns serão já adultos, homens e mulheres, casados talvez, mas no meu coração irão ser sempe os meus "chouchous" que tanta felicidade me deram, da forma mais genuína, demonstrando as suas emoções e sorrindo: esse sorriso que completa tudo e faz esquecer a dor que a vida, por vezes, provoca em cada passo dado. São estes miúdos que me ajudam a encarar a vida com outra cor, nos seus pequenos grandes gestos: quando desabafam, expondo a intimidade dos problemas familiares, falam do seu primeiro amor, das emoções novas que sentem ou simplesmente ajudam-me a apagar o quadro, levam o meu material ou ficam junto de mim, no intervalo, abdicando do seu tempo de descanso, contando o que fizeram no dia anterior, com o entusiasmo de quem parece me conhecer desde sempre.
Ser professor é isto mesmo. Não é apenas fazer funcionar a mente... é saber dar existência, sobretudo, à alma.